O que os potes de vidro das nossas bisavós têm a ver com Cuidados Paliativos?6 min de leitura

O que os potes de vidro das nossas bisavós têm a ver com Cuidados Paliativos?6 min de leitura

Você já parou pra pensar que, talvez, a sua hexavó, sua pentavó, sua tetravó, sua trisavó e todas antes delas tenham vivido menos de 30 anos? E a abençoada da sua avó ou bisavó, nascida a partir da década de trinta, pode ter vivido (ou viverá) talvez 60, 70, 80, 90 ou 100 anos?

Comecei a pensar sobre isso depois que descobri recentemente que durante 200 mil anos, as pessoas viviam em média 30 anos e as principais causas de morte eram: pneumonia, sífilis, difteria, meningite, bronquite, tuberculose, lepra, coqueluche e peste bubônica. 

Não havia cura para estas doenças e as pessoas eram “apenas” cuidadas com o que era possível: sopa quentinha, chás de ervas, compressas de plantas medicinais, preces e longos banhos quentes como forma de alívio do sofrimento, acolhimento e proteção. Os hospitais da época talvez possam ser comparados com os SPAS de hoje em dia.

O cenário começou a mudar na década de 30, por conta de uma descoberta muito maravilhosa: a penicilina – que transformou radicalmente as nossas vidas. Desde então, a expectativa de vida da população mundial cresceu continuamente, nos dando um bônus de 40, 50, 60 anos a mais para serem vividos.

Com o aumento da expectativa de vida, houve uma crença que talvez fosse possível driblar a morte onde os médicos foram se tornando os detentores deste poder, pois tinham habilidade e medicamentos para curar as doenças. Cada micromilímetro do nosso corpo passou a ser investigado, e a medicina passou a criar especialidades que nos proporcionaram benefícios incalculáveis. Isso nos trouxe também algumas consequências: neste momento da história o foco da saúde começou a se “descolar” do cuidado para uma obstinação pela cura.

PARTIMOS DO EXCLUSIVAMENTE CUIDAR PARA O EXCLUSIVAMENTE TRATAR. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE SOFREU UMA RUPTURA.

O surgimento dos Cuidados Paliativos

Na década de 60, Cecily Saunders – enfermeira, assistente social e médica, possivelmente sentiu no seu no contato diário com pacientes este distanciamento entre o cuidar e o tratar. Apesar, ou por conta de todos os avanços da medicina e o aumento da expectativa de vida, camadas importantes de sofrimento que antes eram legitimadas, deixaram de ser acolhidas pelas novas formas de tratamento. 

A morte passou a ser vista como um fracasso e Cecily passou a se dedicar ao cuidado do sofrimento humano. 30 anos após a descoberta da penicilina, ela criou a prática de Cuidados Paliativos, que aqui no Brasil começou a chegar na década de 70, por meio de iniciativas isoladas e discussões a respeito. Porém, somente nos anos 90 os primeiros serviços de Cuidados Paliativos começaram a surgir nos hospitais. 

E é aqui que o hábito de reutilização de potes de vidro da sua bisavó entra em cena… Você deve ter percebido que existe um fenômeno mundial de resgate da forma de viver ancestral, como a necessidade de conexão com a natureza, cozinhar a própria comida, cuidar da sua comunidade, usar roupas até o fim, restaurar móveis, cuidar da sua horta, e por aí vai. 

Estamos nos dando conta que passamos do ponto, que nos desconectamos do que é essencial e que o pêndulo da evolução foi para um lado extremo. Vivemos hoje um momento crucial de busca pelo equilíbrio entre a sabedoria ancestral e o mundo moderno, tateando uma convivência harmoniosa entre estes dois mundos.

Cuidados Paliativos são a representação deste bonito processo de busca de harmonia na saúde, pois concilia o cuidado ancestral de conforto com tudo de maravilhoso que a medicina tem para nos oferecer. Lições de sustentabilidade nos potes de vidro e de amor na forma de cuidar deixado pelas nossas ancestrais.

CUIDADOS PALIATIVOS CONCILIAM E EQUILIBRAM AS PODEROSAS FORÇAS DO CUIDAR E DO TRATAR.

Esta abordagem pode entrar em cena na vida de um paciente a partir do momento que ele recebe um diagnóstico de uma doença grave (que possa colocar sua vida em risco) e pode acontecer concomitantemente ao tratamento, cuidando do manejo da dor, dos efeitos colaterais do tratamento e das dores da alma que se apresentam nestes processos.

Caso o processo de evolução da doença evolua para o final de vida, Cuidados Paliativos passam a ser exclusivos, mais ou menos como acontecia com os nossos ancestrais. Porém, nos dias atuais, utilizam-se recursos medicamentosos que trazem conforto para o paciente, mesmo que o foco não seja mais a cura, mais sim o cuidado. E este é um outro ensinamento ancestral, onde a relação com a finitude era honesta e saudável.

Infelizmente, a realidade aqui no Brasil ainda é muito desafiadora nesta área:

-Temos pouquíssimos profissionais da saúde que trabalham com Cuidados Paliativos.

– Existe um grande tabu em termos conversas sobre a possibilidade de vivermos uma doença grave e sobre a morte. E este desconforto se estende aos profissionais de saúde.

– Profissionais da saúde – que pouco conhecem esta especialidade – apresentam preconceito e resistência, pois ainda estão apegados à obstinação pela cura, sem conexão com a história da humanidade.

– Existe uma crença deturpada de que Cuidados Paliativos estão associados à morte ou desistência do paciente.

Cuidados Paliativos entraram na minha vida quando meu primo Edu já estava em uma fase muito avançada da sua doença. Infelizmente chegou apenas nesta fase, pois se ele tivesse tido uma equipe de Cuidados Paliativos desde o seu diagnóstico, muitos sofrimentos do seu corpo e da sua alma poderiam ter sido cuidados. E viver esta experiência com ele foi uma forma de convocação para falar sobre esta causa e querer transformar a realidade no Brasil.

Neste processo, aprendi que é extremamente desafiador passar por uma doença grave, seja como paciente, familiar ou profissional de saúde. Mas também existe uma possibilidade imensa de conexão profunda, de intimidade, de entendimento do que realmente importa e de quais são os seus valores.

Vamos juntos mudar radicalmente este cenário de Cuidados Paliativos no Brasil?

Você pode começar compartilhando este texto com as pessoas que ama, se informando mais sobre Cuidados Paliativos e se tornando um paliATIVISTA como eu!

“Mas como faço isso?” Aqui estão alguns caminhos:

Participando do “2º Fórum Nacional de Cuidados Paliativos para pacientes” promovido pela Casa Paliativa. Inscreva-se AQUI!

Fazendo parte do nosso projeto “inFINITO e Além”. Saiba mais clicando AQUI.

Assistindo aos nossos conteúdos e conversas no Youtube. Veja AQUI.

Se você tem interesse em se aprofundar ainda mais em Cuidados Paliativos, BAIXE GRATUITAMENTE a nossa cartilha “Cuidados Paliativos: a revolucionária forma de cuidar”. Nela estão reunidos conteúdos ricos e importantes sobre o tema.

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